sexta-feira, 17 de julho de 2009

Sampoema (de Flávio Viegas Amoreira)


Teu ventre regurgita seres de estranheza
orgíaco encanto terra sem marcos
acampamento solidário aos lobos da estepe
poetas / fodidos/ eruditos de céu in-concreto:
campos de pivas orides fontellas panaméricanos
agripinos catadores lumpensinato estelar
vencer Sampa é perde-lhe o medo
tua geografia são seus rostos bolívares-norte-coreanos
lagos anônimos de gozo e morte
a Paulista é praia de ondas com pressa cimento
cal fétido / grana espúria : do Jaraguá vejo-te
cosmovo : Sampa é ducaralho divino esporro
único mundo donde perdi o medo: perder nu ao medo
nu era o começo indistinto agora reconheço
alamedas / janelas / quartos de estória
em cada cômodo um coito / parto / féretro
águas pútridas / córregos em transe / pirajuçaras
marginais de rios carontes refletindo desespero
de Virgilíos e Dantes : cosmoagonias :
Sampa é ducaralho azar mais sorte:
a vida não perdoa desatento transeunte
tudo-todo-rola-cada- instante; poemizosampa
navalhando névoas cinzas nuvens de estanho
ilusão paraísos consoloção liberdade jardins
oscar freires de infame exclusão marianas
ângelas leopoldinas vilas no caminho havia uma
praça trecho arremedo de troços e a praça fez-se
árvore numa igreja de enforcados insones luzes de
horas : cada habitante inapetente é uma paisagem
espreitando esconderijos dalguma memória
te esperam vãos / vales / veredas / te esperam algum
sentido : algum sentido para onde damos em alamedas
becos / beneditocalixtos / anhamgabamentos
conas / répteis / fósseis / múmias virgens
salve Sampa sodomizada / poesia pederasta oralizada:
todo-tudo-sempre é Sampa e Sampa é foda:
aqui-quase-nada / quase-nada/ nada em orgasmo
múltiplos de signos/ significados infindos
vejo estranhos que passam: eu Whitman tropicano:
garanhões / ninfetas / anjos putos/ proxenetas
risco que corro e escorro longa mirada para ser feliz
num átimo / fóton de esquina por esquina
senhas códigos berros espectros em amuradas
Davids Lynchs / Win Wenders / barras códigos estacas:
Meu cérebro é onde? : noites de autorama
Madrugafas mais darks que a escuridão do nada
Interlagos de lágrimas: engulhos esgares vômitos
Da metrópole essa meretriz viada que comigo deita
Quando esparramo-me de paisagem e realizo delírio
Por inteiro : eu sou carona de teus fetiches pesadelos
Espasmos oníricos: insights luminares / beatniks
Transmodernos / aqui Deus é Joyce , Mallarmé é seu profeta :
eu moro é na Literatura sampauleira sampaulisto
sampinferno sanparteiro de entradas
bandeiras volpianas baratas forasteiras trens sobrehumanos
traças suburbanas : trago o gole de amargura oswaldiana :
a tristeza é a prova dum 69
sou 13/ 11 / oito infinito, infinito onde o som se estreita/
andróides / zumbis / iracemas da Vieira / índios de Moema
incorporo metálico estalido dos espigões em meu rabo
e meus cornos eriçados de antenas
Sampa é zoom!!!!
Disposto o peito aberto a camisa em desalinho
Sampa me afronta com sua zona e risco
Sampa é o Ó entre brejos e bronhas :
atmosfera saída dum filme B
assassinatos chacinas negras noir
ferozes volantes / violência fashion
homens mix de mulheres
blade runners andróginos : transgêneros líricos
merda cercada de gente por todos os poros dos lados
dentro estou fora e foda-se o recheio
o borbagato me bulina / sinto a maresia baseada
no Oceano lisérgico na imagética moldada por camadas de cânhamo:
O Mar é longe / vagas de gente empoçam
castelos de areia: a multidão é sempre sociedade anônima :
cambaleio / resisto por grutas/ grotas/ gretas/
rizomas/ elevadores capengam / shoppings da babilônia:
midnights cowboys pela gay caneca
não existem pontes entre todas essa gente
viver é lançar pontes do vazio refletindo a luz do nada
muretas guaritas tiras do ouro bandeirante
nada insiste subsiste uma vista onde nunca se
encaixa ao mesmo tempo ao todo se situa
onde mora o deserto é menos só que na Augusta
a chama tupi jazz, jazz, jazz em terracota e taipa
em Sampa fiespe-se, fiespe-se ou foda-se!
Urbe orbe pulsando fênix de turbinas em chamas
Caldeiras / turbilhão : miragem do movimento
Sempre estamos onde nem supomos
Os vagões levam homens apalpando suas malas
Duras penas / diamantes em pencas chaminés de ouro
Cravejados de sapopembas e diademas
Eu canto por que minha alma não desiste
Penso, louco logo resisto!
Reconheço todas tribos
O gigante polvo capitalista não é nada perto de nosso
Espanto e grito
Cruel argamassa solitude que nos une
Artefatos / bólidos/ hélices / inversão térmica das cores
Sampa é asco que não afugenta
Náusea que me alucina
Sampa não existe : está sendo no ato:
Porra loca dum gozo carcomido
O mercado come-se : dinheiro é autofáfico
Cria é para sempre onde sempre exista
Sampa anda em mim por via estreita
Poetemos onanistas!
Abaixo arcadas cerebrais: descontruir discursos é urgente!
Façamos desse cu doce subversivo argumento.

(na foto: os escritores e artistas plásticos Paulo Pessoa Andrade e Felipe Stefani, o escritor Winner Chiu e tradutora alsaciana Gaby Kirsch, todos na saída do Ponto Chic da Paulista esquina com 13 de Maio)

Foto de Paulo Von Poser