quarta-feira, 22 de julho de 2009

Luta Política Santista Completa 25 Anos (por Carlos Mauri Alexandrino)




A retomada da autonomia política de Santos completa 25 anos no dia 9 de julho. Neste dia, às 11 horas e 8 minutos exatamente, o então presidente da Câmara Municipal de Santos, Noé de Carvalho, terminou de dar posse ao prefeito eleito Oswaldo Justo e declarou restaurada a autonomia municipal.

Nosso direito político mais elementar, de escolher o governo da cidade, foi duramente atingido já no golpe de estado de 1964 e seguiu trôpego até 1969, quando foi perdido de vez sob o manto dúbio da segurança nacional.

Entre um ponto e outro tivemos duas intervenções militares na cidade, perdemos dois prefeitos eleitos, que foram cassados e tiveram seus direitos políticos suspensos por dez anos, outros líderes locais foram igualmente condenados a esse exílio interno.

Fomos considerados, como comunidade, um risco à segurança do país e, finalmente, declarados como incapazes de governar nosso próprio destino.

Os santistas, que não podiam votar no presidente e no governador, como os demais brasileiros, não podiam sequer eleger o prefeito da cidade. Fomos transformados em cidadãos de segunda classe.

O caminho de volta foi uma longa luta cotidiana, demorada, árdua, arriscada durante bom tempo, aquela empreendida pela cidade até reconquistar o direito de autogovernar-se. Só em 2 de agosto de 1983, um decreto presidencial, nos devolveu a autonomia, que seria restaurada, segundo seus termos, com a posse do prefeito eleito. Vinte anos foram consumidos nesse combate.

A luta pela autonomia política de Santos confundiu-se com as lutas gerais do povo brasileiro pelas liberdades democráticas, pela libertação de presos políticos e a anistia. O eco da conquista santista chegou à própria luta pelo fim da ditadura e foi nossa maior contribuição à causa, pelo efeito midiático da eleição numa cidade impedida de votar que reconquistava esse direito, num país onde os cidadãos queriam votar e não lhes era permitido.

Desde a restauração da autonomia política, uma geração inteira de santistas cresceu e amadureceu sob condições políticas democráticas e sabe apenas do que leu a respeito ou nem isso, sobre um tempo de perigos hoje impensáveis. Época em que se podia ser preso pelo que se dizia ou pensava, pela crença política que se tivesse. Período em que se morria nas prisões, sob tortura, ou em execuções sumárias.

Soa mesmo pouco compreensível que não se pudesse eleger o prefeito da cidade, coisa corriqueira, repetida a cada quatro anos. Como fazer toda uma geração entender que mesmo esse voto doméstico é uma coisa preciosa? Que essa ação simples é um direito que exerce porque foi erigido pela força da luta de santistas de outro tempo?

Como podem os mais jovens compartilhar, sem ter vivido, a emoção de uma unidade como a que os santistas forjaram naquele combate? Foi um momento duro, mas rico, que uniu todas as correntes de pensamento político contrários à ditadura, para a busca de um objetivo comum. Como pode ter esse sentimento profundo quem viveu uma vida inteira sob o livre confronto de idéias, com cada linha de pensamento buscando sua expressão própria, como se todos estivéssemos estado sempre e sempre separados?

Talvez seja uma sina que o resultado das lutas de uma geração passe ao cotidiano da geração seguinte com tal naturalidade, que o custo e a beleza daquela vitória original sejam esquecidos com o tempo. Podemos contar a história, relembrar, fazer ver. Mas não podemos reviver sentimentos. E talvez seja bom assim.

Foto de Rafael Dias Herrera: quepes militares sobre a mesa do Salão Nobre da Prefeitura de Santos durante a posse do interventor do governo em Santos.

publicado originalmente no Jornal da Orla

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